Publicado em 31 Maio 2015
Lázaro Alves Martins Júnior. Juiz de Direito da 1ª Vara de Ceres, Goiás. Doutorando em Direito Constitucional pela FADISP-SP.
Dia 15 de março deste ano pode ter marcado o início de uma nova fase em nosso Estado Democrático de Direito. Novas manifestações pelos mesmos motivos tendem a serem maiores, se não forem sufocadas pelo conformismo histórico do povo brasileiro, o que seria um retrocesso ceifando, sem dúvida, o único caminho para pressionar os representantes da República a promoverem reais mudanças. Todavia, devemos nos atentar às promessas vãs ou atos vazios gerados com a intenção verdadeira de desmobilizar a sociedade.
O governo sinaliza com leis contra a corrupção e mudanças no processo eleitoral. Novas leis!
Me vejo obrigado a responder a ele. Assim o faço.
Ora Senhor, o Direito Simbólico, aquele que alterava o comportamento das massas pela sua vigência faliu. Nosso sistema corrupto e ineficiente acabou com ele. Leis, por si só, nada mais desempenham neste contexto institucional sem força na área social.
Senhor, o que acha de nos liberar do sistema que impede um pleno exercício da democracia? O que acha da filiação partidária ser uma faculdade para o lançamento da candidatura? Ora Senhor, estabeleça critérios para estes candidatos surgirem, mas não os impeça de existirem (Te digo, ao pé do ouvido, é antidemocrático, viu?). Com isso Senhor, haverá um forte abalo no absoluto controle partidário vigente que se apropriou do sistema eleitoral e só permite candidaturas que venham acompanhadas de patrocínios e acertos políticos prévios que resultam em malefícios a população, impedindo qualquer mudança real. Quer mesmo mudar algo? Pense nisso Senhor! (Olha, ouça pois digo baixinho, alguns partidos podem sentir muito este golpe, sabe por quê? Eles não têm e nunca tiveram ideologia legítima, válida. Se pautam apenas em conluios de poder).
Da mesma forma Senhor, vamos acabar com a supremacia nefasta do Executivo que torna capenga a democracia? (De novo, ao pé do ouvido, pois sabemos que isso é histórico e mantém no poder aquele sistema econômico, não é? Não precisamos acabar com ele Senhor, só melhorá-lo, fazendo com que atenda melhor a todos).
Como fazer isso Senhor? Deixe-me pensar... o Senhor não acredita de verdade que seja plenamente democrática e mantenha a isonomia entre os Poderes a vossa sensível liberdade para escolher componentes da Suprema Corte política e jurídica que vincula, cada vez mais, toda a população, com julgamentos reiteradamente favoráveis à administração e à governabilidade, não é? Nenhum eleitor tem à sua disposição eleger alguém que possa julgá-lo no futuro escolhendo-o dentro de um número superior a quinhentos mil candidatos. Senhor, no máximo o povo tem a opção de algumas centenas de pessoas para escolher para alguns cargos. Em outros, as opções são inferiores aos dedos das mãos (às vezes de uma) e estes foram escolhidos previamente pelos donos dos partidos.
O que acha Senhor de fazermos assim: o Chefe do Executivo Federal não pode indicar mais do que três julgadores desta Corte Suprema, certo? Escolhidos três, a opção passa para outro Poder que também pode indicar no máximo três. Isso Senhor. Entendeu bem! Seria um rodízio entre os três Poderes. Mas não é só isso, os candidatos também teriam que observar alguns requisitos: nunca poderiam ter tido qualquer atividade político-partidária; não podem ter ocupado cargo nomeado no Executivo ou Legislativo; não podem ter advogado pessoalmente ou através de seu escritório para qualquer partido político ou para Vossa Excelência; deverão ter formação especializada na área constitucional e não podem estar em qualquer das situações de suspeição ou impedimento previstas em nossos códigos de processo civil e penal para com o Senhor ou qualquer partido. Para ficar ainda melhor, não podem ter sido condenados judicialmente ou administrativamente em seus respectivos órgãos correicionais e podem ser rejeitados para figurar na lista de indicáveis a sabatina se assim concluir a maioria absoluta dos membros do órgão de classe de onde origina.
Senhor, faça um levantamento, ainda restarão milhares de excelentes juristas elegíveis para estes cargos, muito mais opções do que o eleitor tem a cada dois anos.
Ah, mas aí não restaria ninguém de vossa inteira confiança Senhor? Mas é justamente isso Senhor. Não buscamos a confiança deste consigo ou seu partido, mas sim com a Constituição e com a população. Apenas isso! (De novo, ao pé do ouvido, a regra seria a mesma para os sucessores do Senhor, então não se preocupe. Só deve se preocupar se a sua intenção não é o melhor para o país, ok?).
Tudo pode ser aprimorado, quer ver? O Procurador-Geral da República passa a ser eleito... por seus membros, sem indicação do Chefe do Executivo! (Senhor, vale para os Estados-membros também, que bom não?).
Preocupado com a governabilidade Senhor? Ficaria instável? Criamos, é fácil e lógico, a suspensão de todos os processos e prazos prescricionais contra o Chefe do Executivo, enquanto detentor deste cargo. Assim dá para governar tranquilo, não é Senhor?
Quem sabe assim Senhor, possamos ter um País verdadeiramente democrático, com a possibilidade do povo eleger pessoas desvinculadas do sistema eleitoral e político viciado que aí está, e um Judiciário também democrático, a começar pelo cume da pirâmide, que passe a ouvir os anseios gerais da população, aqueles legítimos, constitucionais, alinhados com os direitos humanos já assentados supranacionalmente, afastando a impunidade e a interpretação contra majoritária no que não se justifica, o que em nada se confunde com rechaçar a hipótese do clamor público influenciar em um caso concreto.
A área econômica? Vai melhorar Senhor! Eles sabem trabalhar, basta não atrapalhar e não achacá-los. Sem corrupção e influências políticas negativas, vai fluir.
Senhor, mudar as leis mantendo o sistema eleitoral e político e seus proprietários, não muda nada! (Ouça, falo baixinho novamente, é verdade!).