Barco furado
Publicado em 03 Fevereiro 2008
O Rio Araguaia é mesmo surpreendente! Entre tantas espécies de peixes existentes ali, uma me chamou bastante atenção: o Candiru.
Este peixe tem sua história ligada às piores situações e à destruição, talvez por ser um carnívoro é que está intimamente unido a sangue, coisa que deixa muita gente apavorada mesmo só de pensar . Quando morre alguém afogado no rio, logo vem na mente de todos que, se demorar achar o corpo, o Candiru vai comê-lo.
Quando alguém está pescando, eles atacam e devoram todas as iscas e, hora por vez você fisga algum, mas é inútil. São tantos que até o mais entusiasmado dos pescadores conseguiria afugentá-los, afinal até mesmo para tirá-lo do anzol é preciso usar de muita habilidade, pois até nessas horas dispensa muito trabalho.
O que vou descrever aqui é verídico e não história de pescador, antes fosse, pois quem sabe assim, nos pouparia de uma vexatória situação. Ao relatar esse fato, faço com profunda tristeza, não por causa do dito peixe que por sinal, mesmo estando na história é o menos culpado. Pouparei também o nome do local e do suposto guia de pesca, se é que possa classificá-lo de guia, para deixá-lo ainda mais envergonhado, se bem que merece até mais que ser envergonhado.
Era início do mês de abril de 2000, numa tarde normal como qualquer outra, de repente me aparece um senhor de meia idade e sua senhora. Começamos a conversar e perguntei: o senhor vai pescar? Ele disse que gostaria de conhecer melhor a região e poderia até pescar, afinal estavam de férias. Expliquei em detalhes a eles como funcionava as atividades ali, que quase a única diversão era a pescaria, talvez foi neste momento que tenha tomado sua decisão.
O diálogo não foi longo e, logo eles já estavam hospedados no local onde eu trabalhava, tomei todo o cuidado possível para não decepcioná-los, afinal se tratava de pessoas que não conheciam aquele local. Como o objetivo maior dos turistas do hotel era a pescaria, sem demora os novos hóspedes já tinham conseguido um piloteiro considerado muito responsável, até porque o casal não conhecia nada de espécie de peixes.
Os hóspedes estavam felizes com a pescaria, pois, a caixa de isopor estava cheia de peixes, e aquilo, para eles, funcionava como um troféu muito valioso!
Mas surpreendentemente ao ser vistoriado pela fiscalização, no momento de ir embora, verificou-se que ao invés de peixe de boa qualidade, sua caixa estava mesmo era cheia de Candirus.
Só então o hóspede descobriu que tinha sido enganado. A situação foi totalmente constrangedora para todos; o piloteiro tentando justificar o que era injustificável e o pólo turístico de certa forma, entristecido pelo fato ocorrido, afinal aquele nem de longe era o procedimento corriqueiro daquela localidade.
Após várias discussões, o hóspede, que considero um verdadeiro poeta declarou o seguinte: "olha meu senhor, neste momento eu não sinto raiva de você, eu sinto pena, pois em cada episódio desses, mais eu desacredito do ser humano".
Penso que o hotel perdeu o hóspede para sempre, mas toda a região aprendeu uma ótima lição: a força do bom exemplo é a mais convincente que existe e, precisa fazer parte do cotidiano do Mundo.
Luemir Santana é colaborador do jornal Diário do Norte